Cabeça:
Instrumento do Peito
No Caminho - Na Verdade - Na Vida
Instrumento do Peito
“Se o homem fosse apenas mente, adoração mental seria a forma pela qual ele comungaria com Deus.”
Abraham J. Heschel
Há algum tempo eu cooperei na recepção de um grupo de presbiterianos oriundos dos EUA. O grupo viera ao Brasil, dentre outras coisas, para participar em um trabalho social realizado na periferia de Trindade, Goiás. Em dada ocasião, um pastor presbiteriano sentou no banco da frente do carro que eu dirigia; perguntou a que denominação eu pertencia e respondi que era anglicano. Ele então relatou que admirava uma igreja anglicana perto da igreja que ele pastoreava, falou de sua admiração para com os anglicanos, que segundo ele mesmo afirmou, ao contrário dos presbiterianos, conseguiam falar ao coração. Falou também dos esforços que vinha fazendo para mudar esse quadro, pelo menos no contexto de sua paróquia. Não considero que presbiterianos sejam frios; tudo bem que a fama precede, mas falo com liberdade: já fui um anglicano não conformista (presbiteriano) e há de tudo; gente com o coração frio e mente fervilhando, bem como gente com coração quente e mente saudável. Mente que fervilha é sinal de cabeça quente, não de sensatez.
“Na tradição judaico-cristã, a palavra "coração" refere-se à fonte de todas as energias físicas, emocionais, intelectuais, volitivas e morais”, diz Henri Nouwen, mas a gente vive em uma cultura positivista: confia-se na cabeça, desconfia-se do peito. C. S. Lewis compreendeu muito bem isso. Em A abolição do Homem, publicado no Brasil pela Martins Fontes, ele assevera que é ridículo produzirmos homens sem peito e esperarmos deles virtude e iniciativa. Afirmou também que não é o silogismo que, em uma batalha, mantém um soldado na trincheira após a terceira hora de bombardeio. Lewis falou do que viveu, pois fora soldado combatente na 1ª Grande Guerra.
Para Lewis, sem o auxílio de sentimentos devidamente educados, o intelecto é impotente ante ao organismo animal. Creia, a cabeça é instrumento do peito, não o contrário. Não parece adequado, portanto, supor que a razão domina os sentimentos. Ademais, não se discute desejo com argumento, não é mesmo? Desejo se discute com desejo. De maneira que educar os sentimentos é necessário para colocar a mente nos trilhos, não o contrário. Uma olhadela no episódio ocorrido no caminho de Emaús (Lucas 24.1-30) ajuda a entender melhor o que parcamente tento elucidar. Os olhos dos discípulos se abriram e viram/entenderam finalmente que quem estava diante deles era o Cristo ressuscitado (v.31). O que disseram, então? Que, antes de compreenderem que aquele era o Cristo ressuscitado, seus corações queimaram (v.32). Primeiro o coração queima, depois os olhos se abrem. O peito arde e só então a mente compreende. Para que nossos olhos sejam bons e assim todo nosso corpo, precisamos que nossos corações queimem, pois coração que não queima é olho que não vê, é soldado desertor, é noivo que abandona a noiva, é pastor que abandona suas ovelhas depois de tê-las tirado do aprisco. Coração que não queima é gente que usa gente para fazer carreira. Se nossos corações não queimarem jamais estaremos aptos ao amor sacrificial. A lógica, puramente, não concebe que um justo morra por um injusto, não é mesmo?
Um peito quente é o que você precisa para compreender o que terá de fazer. Invista nisso. Ore para que nosso Senhor aqueça teu coração com um sorriso.
No Caminho, na Verdade, na Vida,
Rev. Moacir Gabriel
Capelão